terça-feira, 24 de setembro de 2013

A ESSÊNCIA DOS NOSSOS POETAS

////////// A FESTA DO SILÊNCIO

Escuto na palavra a festa do silêncio.
Tudo está no seu sítio. As aparências apagaram-se.
As coisas vacilam tão próximas de si mesmas.
Concentram-se, dilatam-se as ondas silenciosas.
É o vazio ou o cimo? É um pomar de espuma.

Uma criança brinca nas dunas, o tempo acaricia,
o ar prolonga. A brancura é o caminho.
Surpresa e não surpresa: a simples respiração.
Relações, variações, nada mais. Nada se cria.
Vamos e vimos. Algo inunda, incendeia, recomeça.

Nada é inacessível no silêncio ou no poema.
É aqui a abóbada transparente, o vento principia.
No centro do dia há uma fonte de água clara.
Se digo árvore a árvore em mim respira.
Vivo na delícia nua da inocência aberta.

António Ramos Rosa, in "Volante Verde"

António Ramos Rosa faleceu, ontem, em Lisboa, com quase 90 anos de idade. Ficará para sempre na memória de todos aqueles que gostam de poesia e que o consideram uma figura essencial das nossas letras. Aqui fica a minha homenagem.

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