segunda-feira, 31 de agosto de 2015

ERCÍLIA COSTA, A NOSSA PRIMEIRA FADISTA COM ESTATUTO INTERNACIONAL

Muito tempo antes que Amália se tenha tornado na grande estrela do fado e o tenha cantado nos palcos mais prestigiosos do mundo, houve uma sua predecessora que bem merece o título de primeira vedeta internacional daquela que é, eu não tenho dúvidas, a canção portuguesa por excelência. De seu nome completo (e verdadeiro) Ercília Botelho Farinha Salgueiro, adoptou o apelido de Costa para homenagear a terra onde nasceu -a Costa da Caparica- no seio de uma família de humildes pescadores. Alcunhada, indiferentemente, a 'Santa do Fado' (por cantar de mãos postas), a 'Sereia Peregrina do Fado' ou a 'Toutinegra do Fado', Ercília Costa -senhora de uma voz melodiosa como poucas- atingiu um índice invejável de notoriedade, que a levaram a cantar nas melhores casas de fado da capital; mas não só. Também fez revista, teatro, rádio e cinema, actividades que contribuíram (e muito) para acentuar a sua popularidade junto de um público que a adorava. Foi a estrela de maior fulgor na década de 30 e de início dos anos 40, chegando a fazer digressões por França, Espanha, Brasil, Uruguai e Argentina, onde encantou plateias e colheu excelente crítica. Também esteve nos Estados Unidos da América, nomeadamente em Hollywood, onde privou com estrelas tão conhecidas como Bing Crosby, Cary Grant, Leo Carrillo e Carmen Miranda. Durante a sua carreira, em Portugal, foi sempre acompanhada pelos melhores guitarristas, tais como Nery ou Armandinho; com os quais partilhava uma mútua admiração. Diz-se que, quando o último deles morreu e que o seu cadáver repousava em câmara ardente, Ercília pediu à sua viúva autorização (consentida) para lhe beijar as mãos. Infelizmente, a fadista da Caparica retirou-se prematuramente do mundo dos espectáculos, para casar e dedicar-se à família. Faleceu na sua residência de Algés a 3 de Agosto de 1985, com 83 anos de idade. Dos seus dotes vocais escreveu o «Diário Português», do Rio de Janeiro, o seguinte : «A sua voz é um fio de prata, cristalino, um murmúrio doce e terno, que entra na nossa alma como o orvalho matinal, para adoçar as queimaduras das nossas vidas». Bela e sentida homenagem para quem tão bem interpretou uma canção da qual ela dizia isto, numa das suas criações, o «Fado Dois Tons» :

«Junto aos marcos da fronteira
 Há um letreiro gravado,
 Que nos diz : entre quem queira,
 Mas só quem goste do fado».

Infelizmente, o nome de Ercília Costa já não diz nada aos nossos compatriotas mais jovens. À excepção de alguns deles que -por curiosidade ou por obrigação estudantil- se debruçam sobre a História do Fado e sobre os seus mais ilustres intérpretes. É pena...

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