sábado, 13 de dezembro de 2014

VIDAS QUE SE CRUZAM, AMIZADES QUE PERDURAM...

Ontem à noite vivi um momento de grande emoção. Um momento -que, na realidade, durou uns bons 45 minutos- provocado por um telefonema inesperado, que me foi feito da Suécia por um amigo de longa data, o Teodoro C.. Conhecêmo-nos na Normandia em Janeiro de 1965, num momento emocionante das nossas vidas, ambas convulsionadas pela criminosa acção da polícia política do ditador de Santa Comba; que perseguia, metia na cadeia, torturava e matava por simples delito de opinião. Para evitar esses mimos dos esbirros do fascismo, o T.C. (que era um dos operários especializados do Arsenal) partira clandestinamente para a Europa do norte. Para onde chamaria, mais tarde, a sua família. Ligado politicamente ao P.C.P., não lhe fora dada outra alternativa para além de uma estadia mais ou menos prolongada nos calabouços de Peniche ou de Caxias e da condição de homem marcado. Eu era, quando nos conhecemos, um jovem idealista, militante das J.A.P., um grupo de acção da chamada Frente Portuguesa de Libertação Nacional. Um movimento ecuménico (no sentido político, entenda-se) anti-salazarista. As afinidades criadas pela nossa abominação da ditadura, as conversas que tivemos sobre a nossa ideia do Portugal futuro, o facto de sofrermos com o exílio, determinaram uma amizade e um respeito mútuo que se prolongaram pela vida fora. E isso, apesar do Teodoro (16 anos mais velho do que eu) ter decidido tentar a sua sorte na Suécia, país para onde partiu (com mulher e filha) uns dois anos depois de nos termos conhecido. Desde então (já lá vão uns 46/47 anos...), nunca mais o vi. Durante algum tempo, ainda trocámos correspondência, mas o tempo e as circunstâncias da vida encarregaram-se de por fim a esse contacto epistolar, no qual trocávamos opiniões políticas sobre o momento presente, informação sobre os países onde vivíamos e sobre amigos comuns. Em 1976, fui eu próprio trabalhar (temporariamente) para a Escandinávia, para uma região situada a muitas centenas de quilómetros da cidade de Malmoe, onde o T.C. morava. Comuniquei-lhe esse facto e o meu amigo telefonou a todos os hotéis da cidadezinha (situada na fronteira sueco-norueguesa) onde eu residi 4 meses, na esperança de poder contactar-me. E conseguiu-o ! Foi, pois em 1976 (há 38 anos) que, pela última vez, falaara com ele de viva voz, ao telefone... Daí a minha surpresa ao ouvi-lo ontem, através desse mesmo meio. Falámos de muita coisa... Da situação problemática do nosso país, onde ele esteve pela derradeira vez há 7 anos e onde acha que já não voltará, devido á sua idade avançada (86 anos) e ao seu actual estado de saúde; dos antigos amigos e companheiros de trabalho, muitos deles já falecidos; do tempo que por cá e que por lá faz; da nossa descendência; e até de banalidades. Enfim, foi a conversa de dois velhos, confrontados com as realidades da vida e do mundo. De um mundo que não corresponde em nada áquilo que havíamos idealizado. Apesar de tudo, essa conversa com o Teodoro C. foi um momento grato. O do reencontro de duas vidas que se cruzaram (de maneira efémera), mas que suscitou uma amizade que persiste em manter-se viva. Mesmo através da distância que nos separa e do tempo que tudo desgasta. Obrigado amigo por esse momento irrepetível...

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